Um dia inteiro sem ver meu pimpolho, após uma semana corrida na qual não dediquei muita atenção a ele. A saudade e cobrança martelam minha titela. Principalmente pelo fato de estar em uma festa sozinho, pois as atrações não atrairiam muito a Caio, entretanto, o simples fato de estar comigo já faria a diferença para ele.
Ao fim da minha jornada de trabalho e diversão, quando estou saindo da festa, muito boa por sinal, do querido grupo de faculdade que está com os dias contados para o fim do curso, recebo uma ligação de Caio pedindo para eu levar sorvete. Já previa a agradável noite com filme infantil, pipoca, sorvete e gargalhadas. Daí que uma amiga me deu a idéia tão simples quanto adequada de, ao invés de levar sorvete pra caio, levá-lo a sorveteria.
Caio gostou da idéia e, quando cheguei em casa, prontamente vestiu sua bermuda, sandália e:
“Vamos nessa, papai?”. E eu com uma fome característica de fim de festa, com uma lasanha saborosa à mesa, mas a ansiedade de Caio não me deixou jantar. Fomos à sorveteria ‘Bacana’:
-Quero de morango e chocolate papai! Disse Caio na ponta dos pés para ver as guloseimas no balcão.
-Coloca calda de chocolate, brigadeiro (granulado), não! Quero do colorido, e também as bolinhas de chocolate.
-Ficou lindo o sorvete papai!
Enquanto estávamos saboreando as delicias da sorveteria, Caio com morango e chocolate e eu com delícia de abacaxi, conversávamos sobre como foi o dia:
-Eu tava doido que tu chegasse logo, Papai!
-Porque filho? Perguntei esperando ouvir algo que suprisse minha carência de Caio.
-É que eu estava doido pra tomar sorvete. Respondeu caio sem pestanejar
O silêncio foi o suficiente para ele perceber minha frustração com a resposta e no mesmo instante ele emendou:
-Pra gente ficar junto também papai, tu acha que só tu sente saudade é? Passou a bola pra mim.
Neste momento fiquei mais derretido que o nosso sorvete depois de tanta conversa.
-Papai, tive uma idéia: vamos pra casa assistir ‘a pequena sereia’?
E pra completar o dia extraordinário que tive, um prato de lasanha na cama assistindo um filme com Caio.
Imagine quantas conversas informais no campo da filosofia, antropologia, social, político, espiritual já foram motivadas pelos seus versos. Aquele papo boêmio no qual surgem idéias geniais entre outras ridículas, engraçadas, sobretudo, cotidianas.
Raul consegue através do cotidiano, associar pensamentos que proporcionam uma realidade. Realidade pessoal, na contra-mão dos padrões.
“...Dois problemas se misturam A verdade do Universo A prestação que vai vencer...” (Eu Também Vou Reclamar) http://letras.terra.com.br/raul-seixas/48311/
As pérolas de Raul também estimulam à reflexão e questionamentos sobre postura, sem as quais as pessoas passam a ser inerentes a tudo, agem sem pensar, massa de manobra.
O conformismo disseminado em colonias de exploração através de um estado neo-liberal.
“...Os estrangeiros, eu sei que eles vão gostar Tem o Atlântico, tem vista pro mar A Amazônia é o jardim do quintal E o dólar deles paga o nosso mingau...” (Aluga-se) http://letras.terra.com.br/raul-seixas/48296/
Além de questionamentos políticos existem os sociais e subjetivos com os quais me identifico bastante. Talvez “identificar” não fosse a melhor palavra, “identificar” é muito racional pra caracterizar a subjetividade.
O meu egoismo, é tão egoísta, que o auge do meu egoismo é querer ajudar. Mas Não sei por que nasci pra querer ajudar a querer consertar O que não pode ser... (Carpinteiro do Universo) http://letras.terra.com.br/raul-seixas/68662/
… E no final, carpinteiro... de mim. Eu escutei essa música através de minha mãe... Não só no sentido literal.
E pra finalizar, a que melhor representa os diversos elementos que admiro em Raul.
Espero que toda motivação se materialize, sensibilizando e revoltando ao mesmo tempo.
Ps.: Aqui o link da lista de músicas criada pelo brother Rafael:
Com minha nova atividade, o estágio, e também a volta às aulas na faculdade, foi repentina a mudança para mim, mas vejo que também rebuscou em Caio. Novamente saindo de casa enquanto ele está dormindo e voltando a noite, percebi que ele tem sentido falta de minha companhia, entretanto tem externado isto de forma mágica... como sempre o é. Tem se demonstrado bastante carinhoso, divertido. E eu, cansado, pois não estava acostumado a 'antiga' rotina.
Em uma terça-feira chuvosa, chego à noite, após um banho e o jantar, deito na rede para ler, o que desejei durante todo dia.
- Papai, vamo brincar?
- Estou bastante cansado meu filho.
- Vamos assistir um filme então?
- Se for, acabarei dormindo!
Acho que Caio chegou a conclusão que não teria como me tirar dali naquele momento, e até então, não tinha mesmo:
- Então vou cantar para você dormir, papai.
E cantou uma cantiga de roda que me tocou pela nostalgia, cantava pra ele quando bebê:
-Como pode um peixe vivo viver fora d'água fria... Como poderei viver sem a tua, sem a tua, sem a tua Companhia...
Fingindo que estava dormindo vi quando ele saiu correndo com passinhos entusiasmados.
-Mamãe! Coloquei papai pra dormir. Disse lá na cozinha, diminuindo a voz e pedindo para Juliana não fazer barulho.
Neste momento já tinha refletido sobre como toda esta mudança na minha rotinha o tinha "afetado" e não pude deixar de me emocionar com a encantadora e tranquila forma em que ele administrava isso em sua cabecinha.
Depois de algumas idas e vindas para me ver dormindo e cochichar com sua mãe, quando Caio já procurava algo novo para alimentar sua hiperatividade:
"Mamãaaaaaae!!! Papai tá sonâmbulo!!" gritou gargalhando com a surpresa.
Brincamos eu, ele e Ju até eu dormir de verdade. rsrsrsrsrsrsr
Um dia raiando Um cheiro de chuva Um fim de tarde ensolarado no alto da sé Um abraço forte de saudade Um orgulho de mãe Um solo de guitarra Um “saudade neguinho!” baianamente carinhoso Um chope e um papo Uma paisagem inesquecível Uma flor brotando em ti Um “Galego d’água doce” nostálgico Uma recompensa moral Uma amizade Um escapulário especial Um gol do Santa no Sport Um “É o cú da mãe” nada agressivo Um forró e um cangote Uma gargalhada experiente Um “Mai frescoo” arrastado Uma lua majestosa Uma encantadora curiosidade Um pôr do sol na estrada em uma viajem à praia Uma chegada esperada
Em uma tarde ensolarada de terça, motivado pela ociosidade de Caio – criança sem atividade desfaz a faxina da semana em poucas horas – convidei-o a um passeio, fomos ao Espaço Ciência.
Já no caminho a conversa através do retrovisor central do carro indicava as surpresas e gargalhadas do agradável e despretensioso passeio.
Ele estava a cantar uma música tema de um filme bastante ‘CURIOSO’. A música fala sobre descobertas, fantasias e amor, só que em inglês.
Caio domina a técnica do ‘embromation’ perfeitamente.
- Filho, vou te filmar cantando para que eu faça um novo clipe: Caio, o curioso.
Minha intenção era delinear mais claramente a relação com o universo infantil que no filme é tratada através de um macaquinho disposto a descobrir, fantasiar e acabar com qualquer faxina.
Caio gostou da idéia e prontamente intensificou o treino voltando a faixa no meu celular.
Chegando ao Espaço Ciência, que é um grande parque em Olinda com experimentos, réplicas e bastante verde; ficamos entusiasmados. Dançamos e fizemos a ‘pedalada do Robinho’ em frente a um espelho ‘maluco’ cuja imagem refletia nossas pernas gigantes e nosso tronco mínimo. Em uma maquete de uns 5 metros, vimos como funciona a geração de energia em uma usina hidroelétrica. A ansiedade tomava conta de Caio, pois chegaríamos ao parque dos dinossauros: Representação feita em barro e cimento da geografia e de algumas espécies da era dos dinos.
Ao chegarmos na entrada do parque fomos chamados por uma dupla de PM’s, sentados, pareciam ter muitos anos de farda, cansados e desmotivados, os quais nos disseram que havia possibilidade de assalto no parque dos dinos, pois malandros pulam a cerca do parque e que sem o monitor, naquela hora, era perigoso. Na hora gelei com a provável frustração de Caio.
- O que? Não entendi! Perguntou Caio testando a adequação do discurso do PM.
- É porque tem uns cheira-cola que pulam a cerca e assaltam as pessoas
- Que porra é essa? Policial do parque dizendo isso a uma criança?! Mas aqui não é um parque mantido pelo governo? Deveria ter segurança. Pensei!
Enfim, voltamos sem os dinos, mas continuávamos descobrindo e sorrindo.
Voltando pelo parque, Caio estava fantasiando-se um super-herói em encontro a um ladrão desses:
- Eu torcia o pescoço dele, dava um murro no olho dele.
- E você, papai?
Aproveitei o momento para uma pitada de realidade, pois às vezes a fantasia é ofuscada por ela:
- Eu preferia dar a ele o que ele queria: dinheiro, celular, relógio... à levar um tiro e tu ficar sem teu papai.
Caio nesse momento ficou pensativo até chegarmos ao carro. Eu, para quebrar o clima:
- Esta é a semana do meio ambiente, viremos na quinta e participaremos da exposição com um monitor, inclusive na parte dos dinossauros.
Coloquei uma de suas músicas preferidas ‘o baile da betinha’ no celular, baixei o retrovisor no exato momento do seu sorriso:
- Eu não quero perder nem 1 sorriso seu, filho.
Ele continuou a ouvir a música e, quando volto minha atenção ao trânsito, com a voz mais doce do mundo: